Hoje irei aqui divulgar um conto de Natal. Mas desengane-se quem pensa que este conto tem fantochadas do tipo "Pai-Natal perdeu a memória" ou "os brinquedos ganham vida", porque este conto é verídico. Quem me contou o que relato abaixo foi a minha família que, na véspera de Natal, resolveu desmistificar algo que inconscientemente me fazia confusão há já algum tempo - o facto de, apesar de ninguém da minha família gostar de pinhões, todos os anos no Natal a mesa tem uma taça com estas estranhas sementes.
Depois da ceia da consoada, pergunto eu à minha família:
- "Se ninguém gosta de pinhões, porque é que todos os anos temos uma taça deles na mesa!? Vocês já viram bem o preço dessas coisas!!??"
Depois de algumas trocas de olhares cúmplices, meu pai disse:
- "Não podemos continuar com isto... Vamos ter que lhe contar a verdade acerca da taça dos pinhões..."
Ao que minha mãe com um ar incrédulo replicou:
- "A verdade acerca da taça dos pinhões!!?? Não! Não podemos..."
Foi interrompida por meu pai:
- "Isto não pode continuar assim! Mentiras... Segredos... Omissões... Estou farto! Não consigo! Não consigo!"
- "Mas afinal o que é que se passa?" Perguntei eu, já preocupado. Ao que meu pai respondeu:
- "Nelson... Fecha a porta. O que vai agora ouvir, é imperativo que não saia destas quatro paredes... Nós vamos-lhe revelar a verdade acerca da taça dos pinhões..."
- "O quê? Desculpe, não ouvi."
- "A VERDADE ACERCA DA TAÇA DOS PINHÕES...
(Trovoada.)Naquele momento eu aprecebi-me que depois de ouvir o que meu pai teria para me dizer, nunca mais seria a mesma pessoa. A medo, disse a meu pai:
- "Peço-lhe, não demore... conte depressa... como se de uma lâmina a atravessar a carne se tratasse... ou como se um relâmpago fosse... ou como se de um..." Meu pai interrompeu-me:
- "Carago mas queres ouvir ou não pá!?"
- "Sim, por favor."
- "À primeira vista, aquela taça de pinhões parece ser igualzinha àquela com as nozes e àquela com as avelãs mas com pinhões em vez das nozes e das avelãs... mas a verdade é que o seu propósito é em tudo diferente..."
- "Mas diferente como, meu pai... não compreendo..."
Minha mãe interrompeu a conversa e, com uma intensidade nunca vista em seu rosto, disse:
- "Homem! Peço-te! Reconsidera! Pára com esta loucura! Existem segredos feitos para não serem descobertos!"
Ao que eu repliquei:
- "Não, minha mãe! Agora já é tarde! O que já começou não pode ser parado! A verdade nunca pode ser apenas meia revelada pois é como uma bola de neve a descer uma colina! Prossiga pai! Prossiga antes que a curiosidade me roia por dentro até sobrar apenas minha carcaça cega por anos de encobrimento! Peço-lhe, prossiga!!"
- "Sim filho... assim o farei. Dizia eu que o propósito é diferente porque enquanto que as taças das nozes e das avelãs são enchidas e esvaziadas para que todos nós comámos, a malfadada taça dos pinhões possui no seu interior os mesmos pinhões desde 1989!!"
- "O QUÊ!!!" Exclamei eu enquanto minha mãe desmaiava e caía inerte na carpete cheia de migalhas de Bolo-Rei...
- "Sim" - Continuou meu pai. - "O propósito dessa taça é apenas enfeitar a mesa... dar-lhe mais um pouco de essência natalícia..."
Um remoinho de pensamentos e sensações atormentava-me a cabeça... nisto começo a pensar alto:
- "Mas... não pode ser... uma farsa... todos estes Natais tenho vivido uma farsa... uma farsa que nem sequer é digna de ser retratada em palco... Porquê!? Pergunto-vos família infiel: POOORQUUÊÊÊÊÊ!!!??? Aiiiiiiiiiiiii!!!!! A dor... a dor... A MISERÁVEL DOOOR!! DEEEUUS!!! PPPOOOORQQQUUUUÊÊÊÊÊÊÊÊ!!!!!!!!!????? PORQUE TECESTE NA MANTA DO MEU DESTINO TÃO CRUEL MALHA!!!!!!!!??????"
Meu pai interrompeu-me e trouxe paz à minha alma com uma frase que nunca mais esquecerei:
- "Fala baixo! Sua mãe acorda!"
E assim se passou a noite de 24 de Dezembro de 2005... Um Natal como nunca tive, e como nunca voltarei a ter...
