A Tira Que Sobra...
Porque é que quando se arranca uma folha de papel de um caderno de argolas pelo picotado, não deixamos ficar no caderno aquela tira com os furos, que sobra? Temos a necessidade de a arrancar. E não adianta combater essa vontade porque não conseguiremos dormir em condições enquanto não arrancarmos a dita tira. É que para além de a arrancarmos, não está na nossa natureza deita-la ao lixo assim tal e qual como a arrancamos; temos que a enrolar, dobrar, usar como arma de arremesso ou até mesmo corta-la aos bocados antes de nos desfazermos dela. E não raras vezes acontece que depois de a arrancarmos e de fazermos tudo o que nos apeteceu com ela, não a deitamos ao lixo. Por vezes andamos com ela no bolso, no estojo ou até mesmo no meio do caderno. Existe ainda quem não se contente com o simples arrancar e deformar da tira. Muitas vezes, pessoas fazem pequenos desenhos ou nomes ou até riscos sem qualquer importância ou significado, para além de números, padrões de linhas e/ou formas, anagramas, siglas e riscos de raiva. Por vezes, não nos contentamos com o arrancar a tira de uma só vez (apesar de gostarmos bastante do som que fazem as pequenas “pontes” que ligam o papel ao caderno, ao rasgar). E então vamos rasgando, uma a uma, as “pontes”. Há quem as vá rasgando de seguida; de cima para baixo ou de baixo para cima, há quem comece numa extremidade e quando chega a meio, vai por a outra extremidade, há quem vá despregando as “pontes” ao acaso; e a tortura continua nas suas intermináveis formas.
Mas afinal o que nos leva a fazer isto? Compreendo que a tira sem folha agarrada torna-se obsoleta, e mais, torna-se num empecilho, um apêndice sem uso que é facilmente eliminado… Mas porquê o ritual? Porquê o pormenor? Numa sociedade em que o “timing” certo se tornou essencial, numa sociedade em que já não há tempo para cumprimentar um vizinho e discutir um pouco de meteorologia com ele, numa sociedade em que somos obrigados a correr contra prazos e a trabalhar em função do minuto seguinte; porquê a lenta tortura a que sujeitamos a insensível tira de papel? Não temos tempo para abraçar um familiar mas temos tempo para criar um labirinto vertical numa tira de papel esburacada!? Não acham um pouco esquisito declarar o nosso amor por alguém numa fita estreita de papel em vez de ir directamente à fonte do sentimento!? É difícil, bem sei… mas não deixa de ser estranho.
E dizem vocês: “Porque falas em tortura quando já referiste que a tira de papel é insensível?” Quando arrancam um a um, os “braços” que unem a tira de papel ao caderno, não estão a torturar o papel. Estão a torturar alguém que não entende porque é mais desinteressante que a malfadada fita esburacada… estão no fundo a torturarem-se a vós próprios.
A verdade é que está nos nossos genes eliminar a parte mais pequena de algo que deixou de existir. É quase como os sabugos nos dedos. São criados porque existem pequenas “peles” que não é suposto termos e então trincamos, puxamos e cortamos essas “peles” mesmo que nos causem dor e hemorragia.
A verdadeira questão é: Porque é que passamos tanto tempo a “mimar” com a nossa atenção, algo que sabemos que é perfeitamente dispensável?
A resposta está em nós e é tão elementar como a fome ou a sede. É a necessidade de conforto. Não o conforto que sentimos quando nos sentamos num sofá ou quando nos deitamos numa cama… é mais como o conforto que sentimos quando alguém faz um desenho no nosso caderno ou quando outra pessoa acerta as horas do nosso relógio. No fundo, o que fazemos com a tira esburacada de papel é o “fazer algo sem o fazer”… é o sentir nas mãos o poder de criar e destruir sem ter que sentir nos ombros a responsabilidade de tamanho poder. Pelo menos naquele espaço de tempo em que nos recriamos com a tira, caminhamos Deuses entre míseros Homens… Deuses do nada, mas ainda assim Deuses.
Mas afinal o que nos leva a fazer isto? Compreendo que a tira sem folha agarrada torna-se obsoleta, e mais, torna-se num empecilho, um apêndice sem uso que é facilmente eliminado… Mas porquê o ritual? Porquê o pormenor? Numa sociedade em que o “timing” certo se tornou essencial, numa sociedade em que já não há tempo para cumprimentar um vizinho e discutir um pouco de meteorologia com ele, numa sociedade em que somos obrigados a correr contra prazos e a trabalhar em função do minuto seguinte; porquê a lenta tortura a que sujeitamos a insensível tira de papel? Não temos tempo para abraçar um familiar mas temos tempo para criar um labirinto vertical numa tira de papel esburacada!? Não acham um pouco esquisito declarar o nosso amor por alguém numa fita estreita de papel em vez de ir directamente à fonte do sentimento!? É difícil, bem sei… mas não deixa de ser estranho.
E dizem vocês: “Porque falas em tortura quando já referiste que a tira de papel é insensível?” Quando arrancam um a um, os “braços” que unem a tira de papel ao caderno, não estão a torturar o papel. Estão a torturar alguém que não entende porque é mais desinteressante que a malfadada fita esburacada… estão no fundo a torturarem-se a vós próprios.
A verdade é que está nos nossos genes eliminar a parte mais pequena de algo que deixou de existir. É quase como os sabugos nos dedos. São criados porque existem pequenas “peles” que não é suposto termos e então trincamos, puxamos e cortamos essas “peles” mesmo que nos causem dor e hemorragia.
A verdadeira questão é: Porque é que passamos tanto tempo a “mimar” com a nossa atenção, algo que sabemos que é perfeitamente dispensável?
A resposta está em nós e é tão elementar como a fome ou a sede. É a necessidade de conforto. Não o conforto que sentimos quando nos sentamos num sofá ou quando nos deitamos numa cama… é mais como o conforto que sentimos quando alguém faz um desenho no nosso caderno ou quando outra pessoa acerta as horas do nosso relógio. No fundo, o que fazemos com a tira esburacada de papel é o “fazer algo sem o fazer”… é o sentir nas mãos o poder de criar e destruir sem ter que sentir nos ombros a responsabilidade de tamanho poder. Pelo menos naquele espaço de tempo em que nos recriamos com a tira, caminhamos Deuses entre míseros Homens… Deuses do nada, mas ainda assim Deuses.
4 Comments:
c'um caraças... este post está irrefutável. tu pensas mesmo em tudo! :P
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Anónimo, at 3:29 da manhã
Bgada wipah! Sabs komo é... kuando n há nada melhor pra fazer, a gente pensa...
Bjs
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NelSon, at 11:45 da manhã
Greets to the webmaster of this wonderful site. Keep working. Thank you.
»
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Anónimo, at 9:18 da tarde
This site is one of the best I have ever seen, wish I had one like this.
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Anónimo, at 1:04 da manhã
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